sexta-feira, fevereiro 24, 2006

"Ei, me deixa matar ele. Também sou bandido, cara!"
Cidade dos Homens, Volume 2, por Fernando Meirelles.

Até aqui nada de especial. Não fosse a deixa proferida por um puto de 10 anos. Mas, também, até aqui tudo normal, parece!

domingo, fevereiro 19, 2006

Passam cigarras, no caminho aflitivo de terra vermelha que ele esqueceu.
Passam fios de luz nas portas velhas do casarão altivo, que lá longe o pó corrói.
Rompem-se as correntes do portão estanhado.
Estilhaçam-se os vidros frágeis com o roçar do vento nas frinchas debilitadas.
Quebra-se o brasão. Ardem as folhas. Secam as árvores.
Resta-lhe o jardim sombrio; assombrado pela memória do sonho que perdeu.


sexta-feira, fevereiro 17, 2006

A longevidade da Justiça

Joaquín da Silva, 532 anos.
Manuel Fonseca, 123 anos.
João Almeida, 632 anos.
Marília José, 345 anos.
Ana Pais, 123 anos.
Frequentemente vejo nas notícias (sobretudo brasileiras) as sentenças atribuídas. Com centenas de anos a reboque. Este acumular de anos de condenação faz aumentar o tempo de cativeiro.
Será que o cárcere é o elixir da imortalidade?

quinta-feira, fevereiro 16, 2006

Deixo em teus braços doces sabores que os odores transpuseram.
Deixo em teu abraço a lenta ternura que o calor soprou.
E ao badalar da aurora deixo o suspiro suspenso até que volte.
Na margem do rio estagna a pedra aflita.
Na corrente apressam-se gotas ansiosas de transbordar no mar.
Já avistam a foz. Não sabem se lá vão chegar. Até podem com isso sonhar.
Mas no regaço leva o rio, centenas de lágrimas saradas.

terça-feira, fevereiro 14, 2006

Perdas materiais!

Perdi um saco na Fnac. Ou terá sido noutra loja qualquer. Não sei! Apenas sei que não fiquei preocupada. Coisas banais. Uma mochila e uma camisola! Sim, gastei dinheiro. Não voltarei a comprá-las. Não vou gastar mais dinheiro. Fazem-me falta. Mas remedeio-me com outras coisas. E depois? Não fiquei preocupada. Rio-me perante a minha distracção para as coisas materiais. Para umas pechinchas que não recupero. E depois? Sei que me ri. "Oh, perdi um saco na Fnac (ou noutra loja qualquer, não sei ao certo)"!. Amanhã irei perguntar. Com calma. Se as não recuperar, não sei. Apenas esquecerei. Deixa lá. "Perdi"- direi. Está bem assim. Gosto assim e não faz mal. Deixa lá. Já passa!

domingo, fevereiro 12, 2006

Hoje acordei com a sensação de sono rápido. Dormi depressa. Sonhei célere. Passei o sonho (sim o sonho) em claro, apesar de os olhos terem caído em cerramento soporífero. Pensei num alinhamento sem sentido. E o claro do dia já me despertava os olhos. Reclamo o direito de não ter de dormir. Porque não me inventaste para não ter de adormecer?

quinta-feira, fevereiro 09, 2006

Eu que só queria o silêncio, Trovador!.

segunda-feira, fevereiro 06, 2006

A imagem do Garcia

O Garcia ainda não percebeu os lados do espelho. As imagens reflectidas. Os meandros silenciosos que se quedam na sombra. Os contornos do seu rosto. Ainda não percebeu se é luz ou harmonia. Se violência ou calma as rugas que lhe correm pela face. Ele ainda não sabe. Ainda não descobriu a pura magia. A verdade escondida que lhe quebra o olhar. (Se se detém em pertinência. Ou esquece). O Garcia não sabe se é ele reflectido. Ou outro. Não se reconhece. Não se revê na luminância espaçada. No baço de um vidro fingido e que a ele não reflecte. O Garcia não entende. Ele queria ser outro no espelho. Queria ser a imagem que tem dele e não o rosto que aquele esgaçar de fragmentos na chapa de cristal estanhada espelha. O Garcia não gosta de espelhos, está visto. Não gosta da simetria dissimuladora. Dos pormenores da fealdade. Do ideal vazio que um objecto como aquele delata. O Garcia acha os espelhos fingidos. Injustos expositores que perscrutam a alma sem luta.

Crónica de um mal-entendido

Disseste que sim e eu expliquei. Anuiste e eu reflecti. Deste a entender que três e quatro são sete e eu suspirei. Riste-te. Estendeste a conversa. Percebeste.Foi o que disseste. E não ia haver problema. Tudo era explícito. Entendível!
"Não há problema. Tudo bem".
E quando assim se fala não há nada por explicar. Não há mais nada a acrescentar. Mas na hora de pôr em prática o entendimento, tropeça-se nas palavras.
E não havia mais nada a explicar. O erro foi de quem explicou e não de quem não percebeu. Fui eu que expliquei. Desfiz o mal-entendido (desfiz?). Mas rompe-se sempre a conversa. Desgasta-se as palavras.
As tentativas de explicação (vezes repetidas). Um meandro de dinheiro. Uma pequena coisa. Um nada sem realce. Mas o desgaste lá ficou. O mal-entendido perdurou. Deixou marcas. Queima a vontade e a legitimidade. Talvez rompa com a ligação. Lá ficou.
Explica-se. Reformula-se a explicação. Tornamo-nos chatos. A pessoa não se lembra. Diz que não foi isso que entendeu. Mas anuiu. Disse que sim. Riu-se. Estendeu a conversa para além do necessário. Isso significou que tudo ficou claro. Mas não.
E porque não falávamos na altura do mesmo? Onde estava o descodificador da compreensão além das palavras? Um erro de entoação? Problema com a justeza das palavras. Do certo e do incerto? De tudo e de nada? De mim e de ti? Do valor de um mal-entendido? Do peso de um tropeção?

sábado, fevereiro 04, 2006


Outubro, 2005 - Copenhaga (Dinamarca)

Por Vanessa Rodrigues

Pela continuidade do dia

Não quero que a madrugada me roube o pensamento mais uma vez. Mas é quando o dia se esvazia que as ideias começam a fazer sentido. É no manto negro e no silêncio lá fora que tudo faz mais sentido. Se mais lúcida? Não é verdade. Talvez mais sedenta de vida.
Para quê esperar que a escuridão adormeça. Passe. Porque não a continuidade do dia?