sexta-feira, julho 29, 2005

-IRA-

A ira declina na Irlanda do Norte. Enaltece-se a pacificação. É verdade, a palavra ira é uma excelente metáfora para falar de deposição de armas.

quinta-feira, julho 28, 2005

-Ensaio sobre a realidade-

Esgotamento de recursos energéticos porque a cultura da poupança não figura do dicionário de valores lusitanos. Seca extrema e culturas estragadas. Pobreza, condições infra-humanas de sobrevivência para muitos portugueses, aldeias sem saneamento básico e sem electricidade, entregues ao abandono. Insucesso escolar; iliteracia com percentagens irrisórias; trabalho precário; falta de água; indústria farmacêutica em guerra e senhores da suposta eficiência e gestão do país, preocupados em polir o púlpito da retórica com improdutivas palavras tecidas para entreter. Esqueça-se os reality shows, veja-se Portugal em directo e facilmente se perceberá quão hilariante são os meandros da realidade. Neste mundo, neste país, Saramago é profeta e não se enganou nos previsões. Para quando outro ensaio sobre a realidade?

quarta-feira, julho 27, 2005

-Impunidade-

Sim o cerco está apertado!É verdade que o terrorismo, as ameaças à vida, as pressões psicológicas e as cisões radicais são uma realidade que temos de aprender a integrar nos nossos pensamentos. Há uma série de sonantes "doenças" pós-modernas, conceitos contemporâneos, fabricados pela ganância e a usurpação da identidade que somos obrigados a engolir diariamente. Mas eu pergunto: e as acções dos "justiceiros", as mortes de vítimas inocentes quem as pune? Quem assume a responsabilidade? A Scotland Yard matou um indivíduo que nada tinha que ver com o caso. Há muitos outros sacrificados que desconhecemos. Quem é o responsável? Há impunidade? Já ninguém fala nisso. A imprensa silencia. Essa terrível, tirania de alimentar a memória curta e o esquecimento. Demito-me deste mundo de impunidade, injusto e galardoado com o prémio da leviandade incorruptível.

terça-feira, julho 26, 2005

-Um Mundo Assim-

Enquanto a peleja salta da OTA para o TGV, do TGV para a OTA, perdendo-se por vezes em meandros de disputa sobre a Presidência da República, em guerras orçamentais e divagações sobre "a melhor forma" (e mais mediática) de gastar dinheiro, o mundo padece. Enquanto a birra persiste, o tempo gasta-se e há mulheres no Afeganistão que são perseguidas para a morte. Enquanto isso, há jovens sinistrados a viver em lar de idosos porque os papéis legais caducaram. Enquanto isso, os idosos não têm carinho, apenas rejeição. Enquanto mais que isso, há coisas que quero lembrar como mais importantes, mas que não cabem neste minúsculo blog.

quinta-feira, julho 21, 2005

-Espanta Ladrões-

Há um taipal de obras nos subúrbios desta cidade que julga ser o arauto da repelência ladroeira. De forma directa, incisiva e pueril, o respectivo painel dirige uma mensagem de sensaboria que deixa, em quem a lê, um ar de riso fingido, mas de bom humor. "Senhores ladrões, aqui não há nada para roubar". Ora aqui está uma boa fórmula, pintada a spray, para decorar o exterior das nossas casas e -quem sabe- convencer, assim, os ladrões da inglória investida em casa alheia.

terça-feira, julho 19, 2005

(-Requiem pelo tempo-)

Corre, fugaz, electrónico, incessante. Nós...A chave da poupança do tempo roda a fechadura: supermercados com serviço porta-a-porta; telemóveis que fazem tudo (o que lhes falta adicionar? sentimentos?); shoppings; "fast-food"; Tv-interactiva. Não percamos tempo para ficar ainda mais sem tempo para as coisas mais importantes: sentir, respirar, ver, parar....o silêncio....

-Ver para crer!-

Sim a TV é alarmista. Ok, a TV é sensacionalista, mentirosa, coerciva mentalmente e pornográfica. Mas há um mínimo e a consciência existe. Racionalidade? As últimas notícias falam do furacão Emily e das ameaças emergentes que surgirão na zona do Golfo do México. Mas (claro está) mesmo assim o bom português (tal como aconteceu com o Tsunami) não cancelou as férias para a costa mexicana, ele não só vai de férias para ser sacudido pelos ventos fortes, como também vai ver para crer!

segunda-feira, julho 18, 2005

-Lucrécia Imperial-

Deusa da sedução. Exuberante ao delinear o véu, cobiçada pelo olhar fulminante da paixão. Lucrécia, a imperial, veste-se ao som da harpa do jovem tocador pueril e apaixonado, enquanto as aias lhe penteiam os longos e sedosos cabelos castanhos, perfumados com água de rosas. Lucrécia hoje ainda não enriqueceu o ambiente com a sua voz cadente e embriagada de sedução. A deusa sedutora hoje, especialmente, é vestida calada, como se um feitiço lhe tivesse sido lançado. Lucrécia esqueceu-se da abnegação e reza história que a deusa do encanto se quedou apaixonada.

sábado, julho 16, 2005

-Volta Bárbara, estás perdoada!-

"A Bárbara é uma excelente lisboeta. Ela não merece estas coisas. Oh, Bárbara nós gostamos de si!" Depois deste desabafo público de um reputado político (não são todos ironicamente mediáticos?), a semana passada, só faltava mesmo pedir-lhe: "Volta Bárbara, estás perdoada!".
A verdade é que eu não me queria fiar no que a TV mostrava e a rádio difundia. Um elogio de personalidade à Bárbara Guimarães, para desculpar a polémica da campanha de marketing político do Carrilho? Agora percebo porque é que não existem atestados de incompetência, nem profissionais credenciados que os possam passar: o país não existiria!

sexta-feira, julho 15, 2005

[-Opinião Pública-]

"Eles parecem putos mimados a pedir dinheiro e a fazer birra porque não lhes dão. Isto assim não pode ser! Não sabem governar! Quem dera a muita gente ter as oportunidades que eles têm e eles ainda vêm com estas 'mimalhices'. Minha Nossa!". Palavras da "Dona Lucinda" às 9h no autocarro sobre o comportamento da classe política

quinta-feira, julho 14, 2005

-Papa Shoppings-

Dizem que a crise está instalada. (Ai sim?) Que vivemos a época macabra da recessão, mas eu ainda não vi os portugueses a apertar o cinto. Ainda não vi a poupança. A avaliar pela compra desenfreada e pela maratona aos shoppings para sugar as promoções diria que o país está bem de saúde e recomenda-se. (Pois, eu sei, as eternas aparências!) Há quem tenha corrido os shoppings todos à procura das melhores reduções. A febre das promoções faz destas coisas, elouquece a mente humana. Ou será a lavagem cerebral do marketing? As lojas têm estado à pinha; quem vê de fora parece um combate de formigas (pouco trabalhadoras) - mas esforçadas em conseguir o melhor trapo.

quarta-feira, julho 13, 2005

"Para lá do tempo sobra tempo"

São jeitos desengonçados e queixosos de excelência. São trejeitos sugestivos que se escondem atrás da porta envelhecida, saturada pelo tempo e sorvida pela moda de outrora. Já a sombra se deita por detrás do muro. Já não se vê a nuvem cinzenta que a floresta amansou. Hoje já não se respira o suor das chamas e a poeira das cinzas. Hoje, se houvesse mais tempo, uns momentos que fosse- talvez por uma eternidade, (talvez!) - o homem que luta contra o fogo não tinha perecido ante o poder das brasas demoníacas.

terça-feira, julho 12, 2005

(-Regaço silencioso-)

Se o fio de luz acalentar as tréguas que levas no teu regaço, não ensaiarás um olhar desafortunado, nem calarás o silêncio que teima fechar-se na tua intimidade. Se o fio de luz puser a descoberto o teu sereno sorriso, não mais precisarás de justificar a tua chegada com um mau humor entrelaçado em desalento. Se por eventual fortuna um fio ténue de luz celeste abjurar o teu perfume confessarás, por fim, em voz tremida e titubeante, que o regaço que acabrunhas respira de sossego aos primeiros raios da manhã.

sexta-feira, julho 08, 2005

"Maldito seja quem atirou uma maçã para o outro mundo. Uma maçã, uma mantilha de ouro e uma espada de prata. Correram os rapazes à procura da espada, e as raparigas correram à procura da mantilha, e correram, correram as crianças à procura da maçã".
Herberto Helder, "Se houvesse degraus na terra..."

quinta-feira, julho 07, 2005

-Pedra Esquecida-

A pedra benevolente caiu sem amparo num charco de promessas e gotas descontentes. A pedra seguiu ferida, velha e entristecida, no segundo em que suspiraste. A pedra, essa, calma e entontecida - ainda delirante pela queda de rompante - seduziu a corrente, perdeu-se em pedaços e seguiu esquecida pelo sono para sempre.

quarta-feira, julho 06, 2005

(-Permanece a vaguear-)

Ao jurar-me de encanto um sereno castigo, os olhos esbugalhados não mentiram com decisão, mas timidamente. Levou com ele o leito do conforto e o ar apagou uma réstia de verdade. Perdeu-se no trilho. Não encontrou indicação de regresso. Por lá permanece, ainda, a vaguear.

terça-feira, julho 05, 2005

-#Horizonte quente de embalo#"

Encantam-me os pedaços de nuvens assim desprendidos. Seduzem-me as colinas da aurora, que seguem o rumo das cores de insónias. Já me perdi no doce cheiro das folhas frescas, orvalhadas pela manhã que desperta os ramos majestosos das árvores. Deliciam-me as negras calçadas humedecidas pelas lágrimas do sono e hoje encantei-me pela ternura do pôr-do-sol que se despediu com um laranja pardo no horizonte quente de embalo.
"La beauté est un vice, merveilleux, de la forme".
César Moro, Amour à mort

[-Desperdício de papel-]

Será que os valores da literacia subiram? Os portugueses são mais cultos? Ainda é cedo para avaliar, mas os jornais Destak e Metro são a literatura que mais se vê - e lê?- (por imposição do ardina) debaixo do braço dos portuenses pela manhã. Ainda bem que se lê (?) mais, mas o lado perverso é flagrante. Por imposição do papel gratuito, o Destak e o Metro são também a lixeira das ruas. São também os restos que mais se vislumbram nos passeios, na calçada. Quem querem os portuenses pôr assim a ler?

segunda-feira, julho 04, 2005

-Sol de Estio-

Se o homem de casaco de Inverno voltasse agora em tempo de Estio, não estranharia os vendavais da floresta; não acharia estranho o sol tímido que boceja no céu e anseia um sono. Se o homem de casaco de Inverno, se sentasse na cadeira do jardim, não suspeitaria das flores que explodem em cores sombrias, porque o nevoeiro da insónia ocultaria esta ocasião encoberta. O homem do casaco de Inverno voltou. Bebeu café ao entardecer e pensou que o frio voltara à cidade. Desalentado, o homem, caminhou pela rua ao relento, para procurar a mulher de saia rodada que costuma entreter o tempo nesta altura. Acabou por a encontrar. A mulher de saia rodada, perdera-se na estufa do tempo fabricado; esquecera-se do sol, do calor e dos cheiros estivais. Está agora em reabilitação intensiva.

sexta-feira, julho 01, 2005

-Serviços da Tecla-

Talvez o texto anterior que aqui publiquei (Largo da Peripécia) se tenha vingado contra mim. É, pois. Quando, logo após o ter publicado, constatei que "Largo" estava escrito com "d" em vez de "g", tentei imediatamente corrigir a gralha. Pois bem: tentei...e não consegui, ou melhor, mudei uma, duas, três e quatro vezes. Resultado? Nada de mudanças. Quando actualizava a página lá aparecia a gralha.Peripécia? Não..Desconfiguração do teclado..em vez do "g" estava a assumir o "d". Já mudei os serviços da tecla...Recomenda-se!

[-Largo da Peripécia-]

É uma espécie de canto de gentio que serve de confessionário a todos os que respirem as agruras de uma cidade desgastada e não sabem a quem contar as peripécias de uma lide diária. O Garcia também lá vai todos os dias. Chega até a frequentar o lugar de expiação três vezes num dia. Mas esse homem de ar escorreito e transbordando pecado (dizem que o galanteador concede a perdição gratuitamente) vai ao Largo da Peripécia por outras razões. Esse homem de olhar astuto, perna delgada e respirar ofegante não tem veia religiosa e muito menos paciência para a hipocrisia das beatas. A seu modo, professa uma religião altiva, pouco redentora, mas só dele. Quis a sorte que nos últimos tempos ele ande mais circunspecto. O Garcia vai ao Largo da Peripécia para subornar os encantos singelos da mulher que lê Montálban sentada na relva. Parece que a doutrina da sedução o tramou numa meia tarde porque o Garcia anda mais devoto e menos pecador. A mulher de gestos finos e dada à leitura olhou-o de esguelha da outra vez. O Garcia enamorou-se e nunca mais voltou ao Largo da Peripécia. À mulher, nunca mais a viu.