terça-feira, maio 17, 2005

|-Escaravelho Autista-|

Conheci-o em 1800. Casta distinta. Carapaça recolhida como soçobram os pedantes. Esbocei-lhe um sorriso, respondeu com o desvio da bengala, que sustenta para o brio enaltecer. Falei-lhe das comportas semelhantes ao bem e ao mal- retorquiu com um bocejo de aborrecimento e, entrementes, sibilou uma despedida de modorra. Perdi-lhe a vista, mas ainda vejo muitos como ele...

terça-feira, maio 10, 2005

-Valência hesitante-

Há uma valência que hesita, estarrece, congela ao sentimento...Soçobra e levanta-se ao vento da melindra...Passa assim as tardes a sonhar...
Sabe a doçura o calor do sol...Mancha-se de saudade à dança das folhas que se sentam na cadeira de Homero, displicentes, abjuradas, sentidas e, no limite, esquecidas.

sexta-feira, maio 06, 2005

A tortura das raízes culturais

"Na cultura pop, aprovamos heróis sem escrúpulos para salvar a honra da casa ("saving the day") através de qualquer meio que sustente o fim em si mesmo. É uma questão de fazer o trabalho, não importa como (e com que moral); e nesta questão sempre vai haver muitas vítimas de guerra. Mas ok, (é esta a justificação?) de qualquer forma o mau da fita mereceu-o".
Artigo de opinião de
Teresa Wiltz, jornalista do "Washington Post" -3 de Maio 2005

quinta-feira, maio 05, 2005

-Largo da Inveja-

Olhou com desdém o sopro atribulado do lenço no regaço. Era, por certo, um recato de mulher: gestos aprumados, delicadeza e alguma fineza quando recolhia os pés para se sentar. A fonte declinava um regozijo por ela. O vento dançava em torno dos ombros. O ar sustia a respiração para a mirar.
Quando chegava a meia tarde, o sol escondia o calor e, corado de sortilégio, escondia a mulher que amava...

quarta-feira, maio 04, 2005

-Renúncia à desdita-

O que me aprisiona não é o corpo, não é o espírito desta existência, é este condicionalismo, é essa fatalidade: predominância inquieta...É esta liberdade incessante do nada - ao unir a indiferença, realçar a divergência e o conflito. Porque se ausenta a opção?Porque descansa nos campos cinzentos e injuriosos a doce perdição?

terça-feira, maio 03, 2005

|-Tempo sem tempo-|

Corre, fugaz, electrónico, incessante. Nós...
A chave da poupança do tempo roda a fechadura: supermercados com serviço porta-a-porta;telemóveis que fazem tudo (o que lhes falta adicionar? sentimentos?); shoppings; "fast-food"; Tv-interactiva. Não percamos tempo para ficar ainda mais sem tempo para as coisas mais importantes: sentir, respirar, ver, parar....o silêncio....

segunda-feira, maio 02, 2005

"E se não desejo olhar para a minha vida unicamente como uma sucessão de acasos arbitrários sequentes ao acaso arbitrário do meu nascimento (...) direi antes, assistido pelo doutor Obláth, a questão que se desenhara, a minha existência considerada como possibilidade do teu ser, à luz das sucessivas tomadas de consciência e à sombra do tempo que escorre, transformou-se de uma vez por todas na seguinte: a tua inexistência considerada como a liquidação radical e necessária da minha existência".
Imre Kertész, "Kaddish para uma criança que não vai nascer",
Editorial Presença

domingo, maio 01, 2005

Um cliché se faz favor!

Umberto Eco explica num dos seus escritos que o filme "Casablanca" deve o seu sucesso à trama de clichés que evoca...Se fosse um ou dois, seria um fracasso, continua o escritor, mas como é todo ele pleno de clichés singrou...Ora e não é a vida também um amontoado de clichés, de comportamentos básicos, na calha de estereótipos insustentáveis? E porque é que ela, afinal, não é também um sucesso?